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Criando Marcos que são legais


Só para clarear, o “legais” do título é sinônimo de “massa”, “joinha”, bons, “cool”!


Na semana passada, fui convidado a opinar sobre o projeto de lei do novo Marco Legal Estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação do Rio Grande do Norte, depoimento que ficou registrado na coluna Políticas de C&T do Nossa Ciência.


Quase uma semana depois, recebi (e ainda estou recebendo) vários “toques”. Todos os feedbacks - prós ou contras -, ajudaram muito a refinar o olhar sobre minhas próprias declarações. Venho aqui in site agradecer à audiência pelas contribuições, sempre bem-vindas!


Mesmo estando em um momento Zen de minha vida, alguns comentários mais “animadinhos” do tipo “Ok, ‘bonitão’, e qual é sua proposta, como você criaria um Marco que funcionasse?”, foram suficientemente provocantes a ponto de me estimularem a escrever este artigo. Toques como estes vieram à baia por eu ter insinuado que o Novo Marco Estadual em CTI, seguindo a jornada de sua inócua e antecessora potiguar Lei Complementar Nº 478/2002, é, apenas para mim, claro, mais uma peça de alta complexidade retórica, de difícil compreensão e, por consequência, de baixa execução, uma forma mais extensa de dizer que não terá efeito perceptível.


Novos Marcos são sempre bem-vindos, não tenho dúvidas. O que me incomoda sempre é que, em minha mente, novas coisas deveriam também ser acompanhadas de novas formas de serem feitas, pois já que se apostou em algo novo é porque “algo velho” já não estava mais dando conta. O motivo poderia ser, exatamente, não a proposta do conteúdo, mas a forma de como foi feita. Sendo assim, porque utilizar o mesmo método de feitura para o novo Marco, já que o anterior também não funcionou? É como se um brinquedo quebrado pudesse voltar a funcionar se fosse embalado com um novo papel de presente.


Neste artigo (que não pretende ser uma Aula Condensada, pois não tenho intenção e nem condições de ensinar gente que entende do traçado), buscando apenas coletar mais feedbacks, apresento minha versão do tipo “como fazer” um “Marco Legal legal e marcante” (dá quase um palíndromo: marcante e legal Marco Legal, hehe) na era da design thinking, disciplina absorvida pela advocacia mundial e que deu origem ao Legal Design o qual, por sua vez, alçou o direito à era da Advocacia 4.0 e fez nascer as Lawtechs, startups que visam transformar, e desembaraçar, o mercado jurídico por meio de soluções disruptivas via arranjos tecnológicos. Então, se até o modo de se trabalhar as leis no mundo jurídico está evoluindo, por que a forma de se construírem Marcos empreendedores não? Vamos ver se consigo acrescentar um inciso a este conto!


Já temos leis demais, que foram feitas para não funcionarem!

Deixa eu começar citando as principais para o tema em voga:



O que elas têm em comum, além da complexidade retórica? Em programação, dizemos que uma rotina que pode ser executada concorrentemente, de forma segura, e é capaz de invocar a si mesma enquanto em execução, tem a característica de reentrância. Ou seja: para economizar-se recursos de memória e aumentar a eficiência de uma máquina, quando lida com tarefas repetitivas, busca-se introduzir nelas códigos reentrantes. Ok, funciona muito bem para uma máquina, que não foi feita (por enquanto) para criar. Nossas leis, destinadas a um ecossistema que prega e incentiva o empreendedorismo inovador, são parecidas com estas rotinas de computador. São reentrantes. Elas acontecem concorrentemente, repetidamente e invocam uma às outras (até aqui aceitável), só que em algumas passagens se mostram contraditórias, num ciclo infinito sem sentido. Do mar de vernáculos que são estes escritos, vou dar um único exemplo do que não ficou claro para mim.


O novo Marco, em seu Capítulo VI, cujo título é “DO ESTÍMULO À INOVAÇÃO NAS EMPRESAS”, propõe no Art. 60:


Premissa A: “A Administração Pública Estadual Direta e Indireta e as ICTI/RN promoverão e incentivarão a pesquisa e o desenvolvimento de produtos, serviços e processos inovadores em empresas brasileiras e entidades de direito privado sem fins lucrativos, mediante a concessão de recursos financeiros, humanos, materiais ou de infraestrutura a serem ajustados em instrumentos específicos e destinados a apoiar atividades de pesquisa e inovação, para atender às prioridades das políticas industrial e tecnológica estadual”. Esse texto tá ok. Entretanto, o novo Marco faz menção ao Marco de Inovação, que traz em seu Art. 6º o inciso § 7º:


Premissa B: “A remuneração de ICT privada pela transferência de tecnologia e pelo licenciamento para uso ou exploração de criação de que trata o § 6º do art. 5º, bem como a oriunda de pesquisa, desenvolvimento e inovação, não representa impeditivo para sua classificação como entidade sem fins lucrativos.” O Art. 5º é colocado a seguir:


Premissa C: “Art. 5º São a União e os demais entes federativos e suas entidades autorizados, nos termos de regulamento, a participar minoritariamente do capital social de empresas, com o propósito de desenvolver produtos ou processos inovadores que estejam de acordo com as diretrizes e prioridades definidas nas políticas de ciência, tecnologia, inovação e de desenvolvimento industrial de cada esfera de governo”.


O que liga estes trechos extraídos das principais leis? Eu respondo: a instabilidade jurídica! Explico: a premissa A fala de incentivo às empresas por parte de entes públicos. Ok! A premissa B nos diz que uma entidade privada (uma empresa), ao obter ganhos via transferência de tecnologia, pode declarar-se sem fins lucrativos. A premissa C admite que a União (e outros entes públicos) pode atuar como sócia de empresas (entes privados). Somando as premissas, o Estado poderia criar pequenas empresas - sem fins lucrativos, claro - para verterem seus lucros para si mesmo num ciclo infinito de auto-alimentação e mudança de rubricas. Poderia, inclusive, atuar na administração de empresas privadas. Em outra frente, qual empresa privada se sentiria segura para entrar num processo destes e, de “presente”, tornar-se sócia do Estado ou ter de repartir boa parte dos royalties com ICTs? E nem toquei na “inviabilizante” palavra burocracia!!! Mas não pensemos assim, pois tudo é muito bem regido pelos “termos de regulamento”, que eu não sei do que se trata. E eu nem executei um estudo profundo destes documentos. Apenas busquei por termos-chave que acho sensíveis: participação societária, transferência de tecnologia e royalties. Alguém que entenda do “juridiquês”, com toda certeza, já deve ter passado perto de um infarto. Ou seja, reentrante e instável.


Todo mundo sabe: Inovação se dá no Mercado. Não acontece no Governo nem na Academia. Se a ideia é criar Startups ou incentivar empresas para que contribuam gerando empregos e impostos, o conteúdo do novo Marco (e de outros) afugenta qualquer iniciativa privada que vise lucro, incluindo aí as próprias Startups. E por que tudo isto acontece? A meu ver, estes algoritmos jurídicos nunca foram validados!


Legal Design


O Legal Design se apropriou das técnicas do design thinking para aprimorar seus processos. Os termos-chave que o sustentam falam de pesquisa, ideação, prototipação e implementação, tudo isto conduzido pelo motor principal, a cocriação, criar com o usuário final. Ou seja: em termos de projetos, quem define a proposta de valor é o beneficiário, não quem cria a lei. Uma extensão disso, derrubaria, por exemplo, as consultas públicas, geralmente leigas, para um texto tão específico. Creio serem totalmente ineficazes. Quem deve opinar é quem sente a dor, no jargão empreendedor. Só os envolvidos podem entender e sugerir sobre as cláusulas. Afinal, a quem devem servir os Marcos, ou as leis em geral?


Testar, medir, aprender: cocriando um Marco legal (massa) e marcante


Depois de toda essa lenga-lenga, vou colocar, em forma algorítmica sabor Legal Design, uma proposta de adequação do Marco à realidade local:


  1. Executaria os Marcos Federais aprovados. (já temos um bocado).

  2. Junto a todos os stakeholders (nome chic para os envolvidos), observaria e coletaria em campo, através de entrevistas - de preferência, prós-contras daquilo que está rodando. A isso damos o nome de pesquisa.

  3. Com este calhamaço, voltaria para a sede responsável, aquela que pretende adequar o Marco Federal à realidade local, e promoveria workshops de contextualização com especialistas e potenciais beneficiários do Marco. Esse processo recebe o nome de ideação.

  4. O produto dessa ideação, construído com clientes reais, com dados também reais, em campo, com choro e vela, serviria de base para a proposta do Marco local, o que chamaríamos de protótipo.

  5. O Marco das Startups prevê áreas de teste (ambiente regulatório experimental), nas quais os stakeholders são incentivados a validar regras de negócio sob o cuidado de autoridades do Estado. O protótipo do Marco poderia ser assim testado. Se está ok, salta-se para o passo 6. Se não, volta-se ao passo 2. Chamamos esta etapa de implementação.

  6. Marco local implementado, envia-se para a câmara competente para que seja decretado.

  7. Fim. Ou melhor, começo de jogo!


Finalizando…


Esta seria uma versão única, marcante e funcional de um Marco Legal Estadual no Brasil. Serviria até de laboratório para estudantes dos inúmeros cursos de Direito, Administração, Produção etc., os quais atuariam ativamente na produção do algoritmo, sem falar na galera das Sociais, que trabalhariam os impactos socioeconômicos deste movimento, observando e estimulando, por exemplo, a inclusão de escolas e vulneráveis economicamente. Duvido que não funcionasse e que precisasse mais do que um semestre para rodar.


Com base em meu algoritmo, posso agora esclarecer a fala que proferi sobre o novo Marco Legal, para a qual minha estimada editora, Edna Ferreira, docemente traduziu para poucos avanços. Agradeço seu delicado eufemismo, dileta jornalista. Mas, sendo realista, vou aguardar o outro Novo Marco Legal Estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação do Rio Grande do Norte. Esse, novamente, não tá legal. Não vai funcionar. Só vai marcar!

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